Monday, January 31, 2005
Amoladores: Os senhores do tempo
No imenso imaginário da cidade de Lisboa – incluindo arredores e quiçá outras cidades e lugarejos do país – existe uma figura incontornável e que sempre me trouxe boas memórias: o amolador ou afia-facas.
Esta figura, típica de tantos bairros da cidade que munido da sua bicicleta, ou motorizada caso seja mais abastadito, conduzindo-a à mão por essas ruas íngremes parando sempre que solicitado e fazendo-se anunciar soando uma escala de notas contínuas de uma gaita de beiços.
O amolador sempre teve alguns mitos associados. Um deles e aquele que eu mais aprecio é o que revela que de cada vez que uma destas personagens atravessa os típicos bairros das cidades, traz consigo um prenúncio de chuva que se avizinha. Este prenúncio, não sei baseado em quê, deve advir daquela linha de pessoas que ao sentir dores em certas partes do corpo tornam-se de súbito em meteorologistas creditados por entidade suprema. O mais curioso e até arrepiante é que, em grande parte das ocasiões, estes prognósticos estão certos e parece que São Pedro das duas uma, ou cede a estas dores de rompante ou então envia um tipo de SMS sensorial para uns seres terrenos com poderes extra-sensoriais que são nada mais nada menos que uns meteorologistas arcaicos.
Até conseguirmos ter um sistema de previsões meteorológicas deveras mais refinado, teremos que num âmbito meramente local, que nos fiar na sorte de termos por perto uns familiares a quem o dom das dores faça prever o tempo. Nada melhor do que acordar com um “Doem-me os joanetes... hmm ... hoje levo o guarda-chuva!”.
A alternativa é então vivermos num bairro típico de Lisboa e acordar a ouvir o cantarolar do amolador, acompanhado pela sua gaita de beiços e esperar que encarne na sua pessoa o espírito de um enviado meteorológico do Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica.
